domingo, 3 de agosto de 2014

Entrevista André Takeda

Conheci o André no chat de música do portal ZAZ, logo no início foi fácil perceber a intensidade e o envolvimento dele com a música ou da música com ele. Sempre ligado na cultura pop, que não surgiu, mas se definiu e se assumiu nos anos 90.

Publicitário, dedicou um bom tempo a projetos literários, seja em blogs, sites e também na publicação de dois livros para jovens adultos, adivinha o assunto principal ou o que permeia tudo? Nossa amiga música.

Nos falávamos na sala de bate papo do ZAZ, por e-mail e telefone e a única vez que nos encontramos foi no show do Morrissey, qualquer hora tenho que ir a Buenos Aires pegar um autógrafo nos dois livros dele que ladeiam Nick Hornby, Salinger e Jonathan Coe na minha estante.

Além da literatura tem uma sensibilidade incrível para a fotografia. Abaixo o link de seu portfolio.

www.allthebeautifulthings.com

 

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1) Acho que todos, em algum momento, percebem que a música é algo além de dançar ou se chacoalhar e veem que ela traz muitas emoções e se fixa na memórias ao longo da vida. Qual a música ou lembrança musical mais antiga que tu tens e qual o primeiro disco comprado com as próprias economias? Fale também qual a música ou banda que fez tu perceber que a música teria uma importância muito grande na tua vida?

Sempre digo que sou o que sou hoje por causa de "Inbetween Days" do The Cure. Eu tinha uns 13 anos quando a ouvi pela primeira vez, no carro do meu primo. Lembro que a gente estava voltando da praia escutando a Rádio Ipanema de Porto Alegre. E aquela música me fez sentir algo que nunca tinha sentido até então. Difícil explicar, mas parecia que tudo começava a fazer sentido. Se não fosse por "Inbetween Days" eu não teria começado a ir atrás de bandas como The Smiths, que me levou a Echo & The Bunnymen, que me levou a The Doors, que me levou a ler a Bizz, que me levou a The Jesus & Mary Chain, que me levou a Phil Spector e, quando dei por mim, eu vivia e respirava música 24 horas por dia. E foi essa paixão que me fez querer escrever, que me fez querer seguir a profissão que tenho, que me faz ainda ter algo de adolescente em mim apesar da minha idade. Voltando a sua pergunta, o meu primeiro K7 não poderia deixar de ser o "The Head on the Door" do The Cure, o meu primeiro vinil foi o "Ocean Rain" do Echo & The Bunnymen e o meu primeiro CD foi o "Screamadelica" do Primal Scream.

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2) A função da música pode ser também um modo de socialização, formação de grupos. E nesses grupos pode surgir a identificação com um estilo musical e também a apreciação de uma banda específica, isso para manter a individualidade de cada membro do grupo. Teve um grupo de amigos assim? Qual era a “sua” banda e existia algum estilo que não gostava e que outros amigos apreciavam?

Sempre fui meio deslocado por causa do meu gosto musical. Nos anos 80 não era como hoje, o acesso à música não era tão fácil. E eu era o cara que gostava de música alternativa, naquela época a gente não usava muito o termo indie. Lembro que a minha coluna favorita da Bizz era a Porão, com dicas de novas bandas. No segundo grau, éramos uma meia dúzia de gatos pingados que se juntava para beber e ouvir desde Ramones até New Order. Quando apareceu a internet e as listas de discussão por e-mail, fiquei deslumbrado quando conheci gente de todo o lugar do Brasil que gostava de Teenage Fanclub, Pixies, Belle & Sebastian.

3) Qual o seu show inesquecível, qual o que se arrepende de não ter ido e qual o que gostaria de ir mas nunca teve oportunidade, seja pela distância ou até pelo tempo, tipo um show que foi realizado quando era criança ou não era nascido?

O show que mais me marcou provavelmente tenha sido o The Cure, na primeira turnê da banda no Brasil. Até hoje não sei como os meus pais me deixaram ir, eu acho que tinha uns 13 ou 14 anos. Na lista de inesquecíveis também estão o Jesus & Mary Chain na Reitoria da UFRGS em Porto Alegre, Echo & The Bunnymen no Bar Opinião em Porto Alegre, os três seguidos do Teenage Fanclub no SESC Pompéia em São Paulo, o Wilco no TIM Festival no Rio de Janeiro e o Spiritualized no La Trastienda em Buenos Aires. Ano passado consegui acertar contas comigo mesmo e finalmente vi o Nick Cave ao vivo, lá em Nova York. Pensei que não iria me emocionar, que já estava velho para este tipo de coisa. Mas, putz, o show foi sensacional. De arrepiar mesmo.

Um show que queria ter visto? The Clash, com certeza, na turnê do “London Calling”.

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4) Se não pudesse escutar nenhuma banda ou interprete que lançou discos no século passado o que escutaria hoje?

Das bandas mais novas gosto muito de Vampire Weekend, Avett Brothers, Raveonettes, Arctic Monkeys, Veronica Falls, Islands, Vaccines, Orwells, Lykke Li, Russian Red, Noah and the Whale, é muita coisa. Eu sempre dedico uma parte do meu dia para vasculhar a internet em busca de algo novo para ouvir. Todos os dias leio o Pitchfork, a Paste Magazine, o site da rádio NPR, o Metacritic, os próprios iTunes e Spotify também são lugares onde busco novidades. Às vezes sigo o hype, outras não. Agora que estou mais velho, não dou mais muita bola para os que outros pensam. Só leio as críticas para ficar por dentro dos lançamentos.

5) Fale de algumas bandas, músicas ou discos que modificaram a tua vida de alguma forma e se quiser descrever como e porque?

Bom, já falei de “Inbetween Days” do The Cure… na verdade, é difícil fazer esta lista. Diria que “Be My Baby” das Ronettes é aquela que considero a música mais perfeita de todos os tempos. Outra que me marcou muito foi “Layla” do Derek & The Dominos. Teve uma época que o Jimi Joe sempre tocava essa música na Rádio Ipanema, e eu, mesmo sendo um adolescente metido a pós-punk, me emocionava com a parte instrumental desse clássico do rock. Falando em clássicos, tenho também uma obsessão por “It Makes No Difference” da The Band, principalmente a versão do “The Last Waltz”. Na verdade, se você for analisar bem, todas as músicas que citei são bem diferentes entre si, e acho que isso mostra um pouco a minha relação com a música. Não sei se sou eclético, mas gosto de muita, muita coisa. O que mais mudou minha vida? Diria que o New Order me deu senso de estética. Parece um absurdo, mas além de serem perfeitos musicalmente, a banda de Manchester me fez gostar de design, o que foi importante na minha carreira profissional. E o Wilco, com seu álbum “Yankee Hotel Foxtrot”, me ajudou muito quando escrevi o meu segundo romance, o “Cassino Hotel”. Foi esse disco que marcou o ritmo da minha narrativa. E “In My Life” dos Beatles também me marcou muito. Perdi minha mãe muito cedo, e ela sempre foi a minha maior referência, e ouvir “In My Life” sempre me lembra do quanto manter esse amor incondicional por ela é essencial.

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6) Toca ou já tocou algum instrumento? Teve alguma banda, mesmo que imaginária, como ela (é) era?

Já tentei tocar baixo, mas não tinha esse talento. Tive uma banda na adolescência e decidi ser o vocalista porque escrevia as letras. Também não tinha o talento para cantar, mas pensei que poderia ser um tipo de Ian Brown brasileiro. O baterista da banda era o Gustavo Mini, da Walverdes. Esse sim tinha e tem talento. Eu sempre fui um zero à esquerda musicalmente.

7) Já atacou de DJ ou algo parecido? como foi a experiência?

Sim, já fui DJ “convidado” quando morei em São Paulo, lá no começo dos anos 2000. Foi na Fun House e no DJ Club. Gostei bastante, é divertido, mas o problema é que coloco o que gosto e não o que acho que as pessoas vão gostar. Se eu fosse me dedicar à vida de DJ, acho que iria tocar só soul music, Motown, Stax. É o que acho mais legal para dançar. Apesar de eu mesmo nunca dançar.

8) Se fosse para participar de uma banda, qualquer uma, qual seria e que instrumento tocaria?

Acho que queria ser o Bez do Happy Mondays, aquele cara que não tocava nada e só dançava. Ou, quem sabe, um dos bateristas da turma conhecida como The Wrecking Crew, que era um grupo de músicos de estúdio que gravou com as bandas que o Phil Spector produziu, além dos Beach Boys e até Leonard Cohen.

9) Que músicas ou estilo embalariam ou embalam tarefas cotidianas ou dias específicos, tipo passear de carro em uma tarde de sábado de primavera? Praticar um esporte radical? atravessar a cidade a pé em uma madrugada de inverno? Coloque outros itens.

Complicado… eu ouço de tudo em qualquer momento. Talvez sempre escolha folk quando quero me acalmar. Mas geralmente acho que tudo combina com tudo. Quando estou muito estressado no trabalho, coloco clássicos do punk para levantar o humor: Undertones, Sex Pistols, The Clash, Ramones, The Only Ones. Falando em trabalho, hoje passo muito tempo em reuniões burocráticas, com muitos executivos. E quando sou obrigado a ouvir conversas que não vão a lugar algum, ou bobagens corporativas, sempre penso “com certeza meu iTunes tem mais músicas legais que o de vocês” e isso me faz bem. É muita pretensão, eu sei, mas funciona.

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10) Acho que todos gostamos de algumas músicas que não tem muito a ver com a imagem que temos de nós mesmos, que música ou banda não gostaria de ser flagrado ouvindo por uma pessoa que não te conhece ainda? (que poderia criar uma imagem errada)

Provavelmente Bob Marley. Gosto muito da música do cara, apesar de não ouvir mais nada de reggae. E adoro também algumas baladas muito bregas do Air Supply. Meu sonho sempre foi ouvir uma versão de “Lost In Love” com o Teenage Fanclub.

11) Na adolescência qual era o estilo de música que tu achava que estaria ouvindo hoje e qual realmente está?

Acho que continuo com a mesma linha musical desde a adolescência. Pensava que iria gostar de jazz. Até comprei alguns discos, mas nunca consegui gostar de verdade. Ainda tenho resistência a MPB, hoje nem rock brasileiro eu ouço. Sei que vou ser um velho ridículo que com 60, 70 anos ainda vai fazer air guitar ouvindo rock.

12) Números. Quantos discos, cds, dvds, k7 e livros musicais já teve até agora. Indique alguns livros interessantes sobre música.

Devo ter mais de 2000 CDs e uns 500 vinis. Não compro mais discos, nem ouço mais meus CDs. Está tudo no meu iTunes e o Spotify foi uma revelação para mim. Desde o ano passado comecei a comprar alguns vinis, apenas pelo romantismo. O meu filme sobre música favorito com certeza é o “The Last Waltz” do Martin Scorsese. E o livro que indicaria é a biografia do John Lennon escrita pelo Philip Norman.

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